quinta-feira, 20 de maio de 2010

13 de maio - O que diz o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito

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A 13 de maio, os sete deputados incumbidos de ouvir os protagonistas do 1 de abril elaboraram o seu relatório de 6 páginas.

Dada a importância do caso, os deputados decidiram que seria melhor começar por visitar a Fortaleza D’Amura. Mas quase desistiam. Escreveu a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI): «Depois de vários contactos, a Comissão Parlamentar foi recebida pelas chefias militares».

E foi assim que tudo começou. «Começamos por ouvir uma exaustiva explanação sobre o panorama da situação militar vigente no País, pela pessoa do Vice- Chefe do Estado Maior, António Indjai, que imputou todas as responsabilidades pelos acontecimentos de 1 de abril ao Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, Zamora Induta, acusações das quais se fez o seguinte resumo» (ver a queixa no arquivo do blog/pesos mortos).

O 1 de abril começou muito antes

No dia 4 de Janeiro de 2010, Zamora Induta mandou chamar o general António Indjai a S. Vicente e acusou-o, com mais dois outros colegas, nomeadamente o tenente-coronel Tcham Na Man e o coronel Carlos Cunda, de serem os responsáveis pelo regresso ao País do contra-almirante Bubo Na Tchuto. Calmamente, António Indjai pediu a Zamora que lhe dissesse o nome da sua fonte. Este recusou categoricamente.

Nesse mesmo dia, embora sem sucesso, António Indjai tentou contactar o 1º ministro Carlos Gomes Júnior, e fez o mesmo em relação ao Procurador-Geral da República Amine Saad. O vice-CEMGFA apenas queria que estes movessem influência junto do CEMGFA Zamora Induta para que este revelasse a sua fonte, pois ele apenas queria defender-se. O vice-CEMGFA garantiu à CPI ter «tentado manter sempre informados o PR Malam Bacai Sanha, o 1º Ministro Carlos Gomes Júnior e o PGR Amine Saad».

Indjai disse ainda que esta situação estava a criar um mal-estar no seio da classe castrente. António Indjai defendeu-se dizendo que tudo se ficou a dever «à falta de diálogo do CEMGFA com os oficiais superiores», bem como a intrigas do coronel Samba Djaló, «que se vinham arrastando há já algum tempo».

Posto ao corrente da situação, o Presidente da República, que é igualmente Comandante-em-Chefe das Forças Armadas lá puxou dos galões e conseguiu arrancar de Zamora um nome. Mas não era um nome qualquer. Era ‘o nome’, a fonte de onde Zamora bebia: Samba Djaló, coronel, chefe do Departamento de Informação e Segurança Militar – a sinistra DINFOSEMIL.

Porém, confrontado com a revelação do seu superior Samba Djaló negou tudo. E passou a bola a... Angola! Sim, leram bem: An-go-la. E mais um nome veio à luz do dia: «foi o senhor Costa, da Embaixada de Angola (na Guiné-Bissau)». E o Costa, por seu lado, assobiou baixinho: «Não quero ingerir nos assuntos internos da Guiné-Bissau».

Apertado mais um bocadinho, Samba jogou para o ar mais um nome – Serafim Embaló (pertencente à Segurança do Estado). Este depressa se declarou «inocente» e devolveu a acusação com juros: soube de tudo através do... Samba Djaló.

O dia antes do 1 de abril

António Indjai desembarcou no aeroporto Osvaldo Vieira no dia 31 de março. Era suposto ele estar em Cuba por essa altura para tratamento médico. Telefonou ao 1º Ministro pedindo uma audiência. A intenção era dar conta ao PM da grave situação que se vivia nos quartéis. Fez-lhe ainda um retrato da degradação que estava a ser o seu relacionamento pessoal com o CEMGFA Zamora Induta. O 1º Ministro ouviu mas mostrou-se indisponível para esse dia. No entanto, marcou a audiência para o dia seguinte – 1 de abril de 2010:

Na manhã de 1 de abril, a maior sala da Fortaleza D’Amura estava apinhada, e brilhavam as patentes militares. As mais altas deste País. Muitas mesmo. E foi ali que Zamora Induta e António Indjai trocaram argumentos. Começou com uma acalorada discussão e acabou em... murros! Zamora Induta foi simplesmente detido e desarmado. Samba Djaló também.

Uma vez no comando da tropa – e das operações - António Indjai dá a primeira ordem: ‘libertar’ o contra-almirante Bubo Na Tchuto da sede das Nações Unidas. Mandou igualmente «buscar» o 1º Ministro «para que este viesse assistir - e ouvir - o que tinha para lhe dizer no dia anterior».

À CPI, António Indjai garantiu «não ter torturado» o 1º Ministro e que não foi sua intenção «atentar contra a dignidade» deste. Garantiu ter-lhe manifestado «respeito» e pedido «desculpa pelo sucedido», e lamentando ter chegado «a este extremo». Assegurou ter feito tudo para, «colocar um ponto final nos intoleráveis desmandos do CEMGFA, José Zamora Induta».

Disse ainda ter «garantido o regresso em segurança do 1º Ministro ao seu gabinete de trabalho». E que tomou essa decisão depois de ter sido chamado para uma audiência com o Presidente da República, Malam Bacai Sanha.

PRIMEIRO-MINISTRO

Na manhã de 1 de abril, o 1º Ministro Carlos Gomes Júnior encontrava-se no seu gabinete de trabalho, numa reunião de emergência com o representante Especial do Secretário Geral da ONU, Joseph Mutaboba. O motivo da emergência? Pois está claro – as movimentações militares, rondando as instalações da ONU onde estava o Bubo Na Tchuto, e que culminou com o abandono voluntário do contra-almirante da sede da ONU.

Cadogo acompanhou Mutaboba à saída da primatura, e, no regresso para o seu gabinete foi abordado por um militar, armado, que lhe disse «passa li, kumpanha ku nôs». Do armário do gabinete do PM os militares retiraram alguns documentos, telemóveis e dinheiro. E o 1º Ministro, claro.

Quando já estava dentro da viatura militar, o ministro da Administração Territorial Luis Oliveira Sanca apareceu e inquiriu sobre o destino da comitiva. Foi agredido violentamente e intimado a entrar para a viatura. E seguiu tudo para a Fortaleza D’Amura. Luis Sanca foi sem os óculos, que entretanto se partiram com a agressão de que foi alvo.

Lá chegados, encontraram um António Indjai furioso, mas ainda assim ansioso por tirar tudo o que tinha cá para fora. Entretanto, um sinal sonoro interrompeu o general. Era o Presidente da República ao telefone. E a chamar Indjai de urgência à Presidência. Abandonados à sua sorte, os agora detidos não tiveram outro remédio que não esperar. Mas não esperaram muito. A salvação chegara para Carlos Gomes Júnior e Luis Oliveira Sanca. Indjai disse apenas a Cadogo: «volte para o trabalho e acalme a população que há já muita especulação por aí».

Na CPI, Carlos Gomes Júnior «lamentou o ocorrido a 1 de abril», que qualificou como tendo sido um «incidente». Discorreu sobre o impacto negativo que isso teria junto dos parceiros como o FMI e o Banco Mundial e lembrou aos deputados que no dia seguinte, o Conselho de Administração destas duas instituições deveriam discutir e aprovar o programa pós-conflito, o que acabou por ser adiado.

O 1º Ministro confirmou à CPI ter recebido o telefonema do general António Indjai no dia 31 de Março, mas culpou o «cansaço da viagem» para o não receber. Disse ainda ter pensado que a audiência se devia a um pedido que o general lhe havia feito, para a obtenção de documentação para um filho seu. A reunião ficou agendada para as 08.30h do dia 1 de abril. Até hoje...

Guarda-bombas

Pretendendo justificar a falta de segurança pessoal, Cadogo deu um exemplo à CPI, dizendo que o seu primeiro guarda-costas foi substituído por ordens de Tagmé Na Waie, à altura CEMGFA, e foi este que, curiosamente, viria a colocar a bomba que haveria de matar Tagmé. O PM revelou ainda que «viu o substituto do seu guarda-costas na escolta do Bubo Na Tchuto quando este deixava as instalações da ONU».

Finalmente, e a pedido dos membros da CPI, os Deputados visitaram Zamora Induta e Samba Djaló no aquartelamento de Mansoa. O CEMGFA queixou-se de tensão arterial - no relatório, os deputados escreveram detenção arterial... – e disse ter sido visitado por um médico. Samba Djaló, esse, mostrou ser um durão. «Estou bem de saúde», revelou. Questionado pelos deputados se foi torturado, respondeu: «sou um militar e estou preparado para isto».

António Aly Silva