quarta-feira, 27 de junho de 2012

Nem tudo o que brilha é ouro


"Prezado Aly,

Permita-me mais uma vez debruçar sobre um assunto, revolvendo-o e faze-lo vir a tona, assunto que para mim ao invocá-lo me serve de exercício de aprendizagem e, suponho que para os meus conterrâneos seja mais uma aventura ou curiosidade inconclusiva, do extrair uma pedra no sapato ao andar ou dum osso atravessado na garganta.
 
A advertência de que «nem tudo o que brilha é ouro», induziu-me a estabelecer um paralelismo “quantidade versus qualidade”, associando-a harmoniosamente à um assunto translúcido de há varias décadas, mas submergido no ego de certos dos nossos conterrâneos, que se inclinam irresistivelmente ao princípio de que a superioridade numérica é o vector da ideia duma qualidade superior. O que não é o caso!
 
Mas de um outro lado o é, isto é, da parte de alguns dos nossos conterrâneos que durante todas essas décadas senão séculos, a natureza foi «pródiga» para com eles em termos de fertilidade e de reprodução, impondo-se numericamente dentro do xadrez demográfico da Guiné-Bissau. E sendo eu um averso à denominação especifica de índole étnico-tribal, e para retratar esse grupo, prefiro fazer uma abordagem em termos antropológico e sociológico, que durante os respectivos estudos tornaram publico e conclusivo em como esse povo, nas suas origens e relações sociais, são classificados pela inexistência de hierarquia, ou seja ausência de estratificação social, dai que são denominados de sociedade «horizontal».
 
Sem alguma pretensão pejorativa, os nossos irmãos da sociedade "horizontais", desculpem o termo, que acho suave e, que tive o cuidado de pôr entre "aspas", durante décadas reivindicaram as suas superioridade numérica, e utilizando essa quantificação como razão para confiscarem e ter como refém as instituições do estado, ignorando o factor qualidade, que devia ser uma amálgama, para produzir resultados positivos e justificar essa superioridade.
 
Consta que, etnicamente ao invocarem essa superioridade numérica em termos demográficos, seja ela duma forma espontânea ou propositadamente, nem se apercebem de que estariam a diluir a expressão [quantitativa e qualitativa], das outras comunidades étnicas que compõem o nosso rico mosaico demográfico.
 
Essa confiscação e acto de fazer refém as instituições do estado, justificadas debilmente pela quantificação numérica, é o paradigma do pelo facto de se ser mais numeroso, implicaria assim automaticamente possuir qualidades, sinónimo de capacidades, boas e requeridas para um determinado desempenho positivo.
 
Dai que um convite é endereçado à todos nós, Guineenses, para contextualizarmos histórica e geograficamente essa superioridade numérica reivindicada pelos nossos irmãos "horizontais", tanto na luta armada de descolonização [meu termo preferido em vez de independência] como em inúmeras outras vertentes.

No caso especifico da luta armada, que se saiba de que, essa luta foi dirigida na zona Sul do nosso país, que por coincidência era zona de maior confluência dos nossos irmãos "horizontais", fosse a luta armada gerada nos arquipélagos dos Bijagós, concerteza o cenário seria outro; ou se fosse ela gerada no Leste, ai o compasso teria traçado um ângulo de 45 graus; fosse ela no Norte, talvez o compasso traçaria talvez um ângulo de 90 graus e; fosse ela em Bissau talvez teríamos um ângulo de 180 graus, e ai por diante.
 
E que fique bem claro de que, quanto maior se é, mais probabilidade existe e mais vulnerável se fica exposto em ter elementos medíocres num processo de filtragem e de qualificação.
 
Portanto, que fique bem claro ainda de que, na aplicação da lei da proporcionalidade numérica em qualquer sociedade não deve ser tida como um apanágio, mas sim dum factor forjador de fusão e de diversidade cultural, e nem tão pouco quantidade prima sobre a qualidade. O protótipo concreto, é o caso das nossas forças armadas [onde os mais numerosos não são melhores do que os menos numerosos]; no parlamento da legislatura deposta [o partido maioritário não teve a qualidade suficiente para se impor convincentemente nos debates]; na esfera dos partidos ou melhor grupusculos políticos [as minorias é que fazem perfilar as qualidades mínimas requeridas dum partido politico e, não a maioria medíocre como ela se apresenta]; nas nossas escolas [muitas escolas mas delas uma ínfima parte apresenta qualidades]; nas nossas bolanhas [temos muitas, mas importamos arroz mais do que produzimos, ou quase nada produzimos]; nos mares e rios [temos quantidade incomensurável de peixes, mas consumimo-lo infimamente] a exemplificação seria extensiva se pretender continuar, essa seria só a ponta do iceberg.
 
Racionalizando esse assunto, urge exorciza-la de uma vez por todas, retirar o manto de opacidade sobre essa lamentação, e passarmos a inverter a tendência de invocação das lamentações em : " nós é que temos maior e melhor qualidade" ao invés de perpetuar no " nós é que somos maioritários" ou " nós é que lutamos mais"; " nós é que....... etc, etc."
 
Porque nem tudo o que brilha é ouro.
Pabia i ka tudu kê ki a lampra ki uru.
 
Nevabamon, S. Tcharty"