sexta-feira, 12 de julho de 2013

Conferência Nacional Sobre Impunidade, Justiça e Direitos Humanos


Excelência Sr. Presidente da ANP
Excelência Sr. Primeiro Ministro
Excelência Sr. Representante Especial do Secretario Geral das Nações Unidas na Guiné-Bissau Premio Nobel da Paz;
Ilustres convidados
Caros jornalistas

Na qualidade do Presidente da LGDH e representante das Organizações da Sociedade Civil congratulo-me com o convite formulado pelos organizadores desta pertinente iniciativa de Conferência Nacional sobre, Impunidade Justiça e Direitos Humanos. Este gesto traduz-se num reconhecimento do papel incontornável das organizações da sociedade civil na promoção e defesa dos direitos humanos assim como no combate a impunidade.

Os três dias de intensos debates sobre diferentes temas relacionados com direitos humanos, justiça, segurança e impunidade, permitiram criar bases sólidas com vista a identificação dos estrangulamentos e propor os mecanismos e estratégias claras e coerentes para o combate a impunidade na Guiné-Bissau.

Como é do conhecimento público, a Guiné-Bissau tem vivido nos últimos 12 anos, períodos de maiores turbulências e instabilidade da sua história, traduzindo-se num ciclo vicioso de violência política e militar que tem culminado sistematicamente com perdas de vidas humanas e danos patrimoniais, com o agravante dos autores morais e materiais destes acontecimentos nunca são traduzidos à Justiça por forma a moralizar a sociedade e resgatar a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas e respeito pela legalidade.

Para a LGDH e demais organizações da sociedade civil, a impunidade constitui actualmente o maior desafio para os direitos humanos na Guiné-Bissau e tem funcionado como o principal factor de motivação das cíclicas instabilidades políticas e militares com efeitos contraproducentes e adversos aos esforços para a consolidação da paz e reconciliação nacional.

A inoperância das instituições judiciárias, associada a ausência de uma estratégia consistente para o combate a impunidade, tem servido de incentivo e fundamento para uma escalada de violência contra a vida e integridade física dos cidadãos, para além dos atentados sistemáticos contra a democracia e o estado de direito.

Excelencias! 

Nos últimos anos, o quadro global dos direitos humanos tem agravado de forma preocupante na medida em que assiste-se à escala nacional violações sistemáticas dos direitos humanos a todos os níveis senão vejamos:

 Os autores morais e materiais dos assassinatos de 2009 e 2012, que provocaram maiores roturas no tecido social guineense e com consequências imprevisíveis em termos políticos, militares, económicos e sociais, continuam impunes e por traduzir à Justiça, perante a inércia das autoridades judiciais.

 Continuamos assistir incidentes comunitários os quais sistematicamente têm culminado com assassinatos sem que haja uma acção enérgica e eficaz das autoridades nacionais.

 No plano económico e social, o povo guineense continua a deparar-se com problemas de falta de acesso à água potável, à saúde, à educação, um dos sectores mais abalados pelas cíclicas e intermináveis subversões da ordem democrática, associado a ausência de uma política social efectiva de redução da pobreza orientadas para fazer face às reais necessidades da população, sem ignorar à degradação das infra-estruturas sociais, alta taxa de mortalidade materna e infantil, alto grau de desemprego e fornecimento irregular da energia eléctrica.

 De igual modo, se assiste os relatos da existência da fome no interior do país decorrente da má campanha da Castanha de Caju com repercussões alarmantes caso medidas correctivas não forem adoptadas.

 Continuamos assistir ainda violações graves dos direitos humanos das mulheres nomeadamente mutilação genital feminina, casamento forçado, violência doméstica, abusos sexuais, morte das parturientes, tráfico de pessoas, enfim, atentados contra a dignidade da mulher.

 Aumento galopante da corrupção activa e passiva no aparelho do Estado, incluído nas instituições judiciárias.

Estas constatações irrefutáveis devem-se essencialmente ao facto da definição do rumo político da Guiné-Bissau ter vindo a ser feita com recurso a meios ilegais ou anti-democráticos, onde a promiscuidade da classe politica com a castrense tem degenerado em crises que adiam sine die, os sonhos de desenvolvimento sustentado que os guineenses sem excepção,  tanto almejam.

Nesta perspectiva, é do nosso entendimento que a profissionalização e a democratização das forças de defesa e segurança e a reforma do sistema judiciário e politico assumem-se como imperativos categóricos por forma a permitir a estabilidade governativa, respeito pelos direitos humanos e combate a impunidade, enquanto premissas básicas para atracão dos investimentos externos, criação de riquezas e consequente resolução gradual dos problemas sociais e crónicos com que o país depara.

Excelencias!

Se é verdade que o combate a impunidade não pode produzir os efeitos desejados sem a existência de instituições judiciárias fortes, independentes e imparciais, não é menos verdade que um sistema judiciário selectivo nas suas actuações não só produz efeitos contraproducentes mas também mina os esforços de reconciliação e os ideais da consolidação da paz, para além de atiçar os sentimentos de ódio e da vingança.  

Por isso, é nossa convicção que os valores da paz, tranquilidade e bem-estar social na Guiné-Bissau só podem ser efetivados com a realização de uma verdadeira justiça capaz de condenar os criminosos e ilibar os inocentes.  

Dai ser premente e prioritário a criação das condições materiais e humanas para a existência das instituições judiciárias funcionais em todo o território nacional facilitando aos cidadãos o acesso a justiça, e a resolução dos diferendos com base nos critérios da legalidade.

Excelência Sr. Primeiro-ministro

Na sequencia da alteração da ordem constitucional no dia 12 de Abril de 2012, os diferentes actores políticos e militares assinaram um documento intitulado “acordo político” em Maio do mesmo ano que prevê entre outras coisas a a adopção pela ANP de uma lei de amnistia em favor dos autores do referido golpe de estado.

Para reavivar a memória dos guineenses e da comunidade internacional, a Assembleia Nacional Popular aprovou no dia 4 de Março 2008, a lei nº 5 / 2008, pela qual foram amnistiados os crimes e infracções de motivações político-militares, cometidos tanto na Guiné-Bissau como no estrangeiro desde a independência até ao caso 6 de Outubro de 2004, que culminou com os assassinatos do Chefe de Estado Maior, General Veríssimo Correia Seabra e do Coronel Domingos Barros.

Desde esta altura até à presente data, a Guiné-Bissau assistiu um ciclo vicioso de instabilidade politica e militar ou seja, duas alegadas tentativas de golpes de estado, assassinatos de altas figuras do estado e de cidadãos comuns, espancamentos e detenções arbitrarias, várias sublevações militares, um golpe de estado, e outros casos que envolveram os militares e dirigentes políticos, pondo em causa as bases sobre as quais assentam a democracia e o estado de direito.

Estes factos demonstram de forma inequívoca que a opção pela via de amnistia na realidade guineense não só consubstancia desvio aos seus fins nomeadamente, de pacificação e reconciliação, mas também serve de incentivo à institucionalização da impunidade e as violações sistemáticas dos direitos humanos.

Aliás, preocupado com o uso inadequado do instituto de amnistia na Guiné-Bissau o Conselho de Segurança das Nações Unidas adoptou a Resolução No. 1580 de 22 de Dezembro 2004, que entre outros assuntos, faz um apelo a ANP no sentido de ter em conta os principios da Justiça e de combate a impunidade quando concede amnitia a todos os envolvidos em intervençoes militares.

Quero em nome da LGDH e demais organizações da sociedade civil comprometidas com os ideais da justiça, da reconciliação e da paz, deixar bem claro a nossa firme determinação de combater todas as iniciativas que visam desvirtuar a justiça e transformar a amnistia como uma mascara da impunidade.  

Excelência Sr. Primeiro-ministro 
O respeito pelos direitos humanos, a luta pelo desenvolvimento, a solidariedade, a tolerância, a liberdade, a justiça, a convivência pacífica entre outros são grandes desígnios em torno dos quais os guineenses devem unir cada vez mais, pois as mudanças que se pretende alcançar em todos os níveis exigem de cada um de nós, o grande desafio de trilhar os caminhos da paz, combatendo as indiferenças e apatias, em nome duma cidadania cada vez mais interventiva e catalisadora das referências positivas.

Para terminar quero aproveitar esta oportunidade para felicitar todos os activistas dos direitos humanos que labutam incansavelmente e em condições de alto risco, a favor de uma Guiné-Bissau mais cívica e respeitadora dos direitos humanos, sem no entanto descurar aqueles defensores que labutam na clandestinidade, nomeadamente jornalistas, sindicalistas, médicos, Advogados, Magistrados, enfermeiros entre outros, encorajando-os a prosseguirem com as suas acções.

Uma palavra de apreço aos nossos parceiros internacionais sobretudo ao sistema das Nações Unidas, a União Europeia pelo inestimável apoio que nos têm dados sem os quais seriam muito difíceis de cumprir com as nossas missões e responsabilidades.

Pela Paz, justiça e Direitos Humanos
Muito obrigado